Lógicas relativas

PEREGRINI SANTIAGO

"A própria razão é uma condição subjetiva, fruto do mundo objetivo e estabelecido pela observação dos fenômenos. A razão não é algo absoluto e sim algo relativo à mente, algo formado a partir das relações entre as coisas que constituem o mundo individual."
 — José Laércio do Egito.

O Universo é um meio complexo formado por cores, formas, densidades, relações espaciais e massas organizadas sob as mais variadas combinações. O mundo é a representação imagética do alcance perceptivo e conceitual dos seres, sobremaneira ancorada a sistemas de códigos sociais, os quais, inclusive, ditam e delimitam o racional.

Em geral a razão é definida como a “capacidade de distinguir o verdadeiro do falso”. Ora, visto que o mundo não é efetivamente o que vemos e sentimos, então, ele é falso. Sendo assim, como poderia ser imutável a razão? A racionalidade está condicionada à capacidade pessoal de distinguir o verdadeiro, ou seja, está fundamentada em imagens mentais flutuantes e inconsistentes, variáveis também em função da perspectiva vibratório-dimensional em que esteja o indivíduo. A lógica expõe como o ser deve pensar racionalmente, mostrando igualmente quais as condições de um pensamento “coerente” e de “bom senso’. Tudo isso seria perfeito, caso o “bom senso” se baseasse numa análise essencial e invariável dos objetos do mundo. Contudo, qualquer análise “racional” está sujeita aos limites projetivos das apreciações mentais, como temos dito. O objeto analisado é apenas uma construção mental oriunda, de um lado, da percepção espaço-descontínua efetivada pelo limite do alcance da percepção, do outro, da rede conceitual internalizada como paradigma de existência. Após a observação de determinado fenômeno, a mente, baseada, sobretudo, no padrão circunstancial repetitivo do alvo em análise, conclui que existe uma lei inexorável à qual o objeto está sujeito. Ao mesmo tempo, a percepção estabelece relações semântico-sociais entre a imagem do objeto, a sua materialidade, a sua posição espacial e o conceito adequado à sua representação simbólica. Quando esta relação é harmônica, diz-se que existe coerência em dado fenômeno ou relativamente a determinado objeto.

Com efeito, existe uma forte identificação entre a o objeto ou evento observado e a sua repetição como fenômeno. Então, a “razão” é oriunda não de uma suposta dimensão lógica exterior à mente, mas de uma necessária inter-relação entre o elemento percebido ou raciocinado e o seu padrão de recorrência. Por conseguinte, qualquer enunciado de determinada lei é necessariamente uma expressão de um paradigma observacional ancorado em limites variáveis de observação. Todas as leis universais são ilusórias a rigor, mas verdadeiras relativamente. São irreais de fato, mas reais para os observadores adequados às circunstâncias favoráveis para a sua racionalização. Nenhuma lei catalogada pode ser “verdade absoluta”, pois requer parâmetros para manifestar-se. Ao nível profundo-absoluto, existe, contudo, Uma Única Lei, a qual dá origem a todas as outras, secundárias, ilusórias e impermanentes.

Um objeto que for lançado para cima tende a cair, devido, de acordo com as observações experimentais e a lei da Gravitação Universal. Com efeito, é algo “lógico e racional”. Aceitar isso é atender à razão, por ser o que sempre acontece em decorrência de uma lei física. Mas isso somente é razoável porque se repete constantemente e se repete porque atende a uma condição inerente à matéria. Bastaria, hipoteticamente, que se neutralizasse a gravidade e o corpo já não cairia e, então, o fenômeno “deixaria de ser razoável” e tudo se passaria como se fosse um atentado à razão. A partir deste exemplo, podemos sentir que a lógica se baseia, a rigor, em resultados da observação de um fenômeno repetitivo, sob circunstâncias adequadas. Um corpo atirado para cima deve cair, isso se repete, portanto, é aceitável, lógico e válido, desde que não surjam outras condições que alterem o resultado. Se novas condições forem estabelecidas, será preciso também uma nova lógica para atender ao fenômeno, mesmo que esta lógica, momentos antes, fosse uma condição absurda por ser uma discrepância à regra geral.

A este respeito, vejamos o seguinte: se não se conhecessem condições capazes de modificar o resultado esperado da força de gravidade sobre a matéria, seria um milagre se qualquer alteração inesperada ocorresse durante a queda de um corpo. Se um corpo deixasse de cair não seria razoável, seria algo completamente ilógico. Se, no passado, um foguete se libertasse da Terra e não caísse depois de esgotado o seu combustível, isso, por certo, seria um atentado à razão, portanto, um milagre, um fenômeno capaz de ser considerado ilusório ou fantástico, por contrariar a lógica experimental. Mas, quando se soube que, além de certo nível de aceleração, a gravidade de um corpo [como, por exemplo, um planeta] não é mais capaz de manter presa uma determinada massa, o padrão de recorrência lógica do fenômeno gravitacional passou a apresentar outro nível de possibilidade.[1] Então, apenas com esse dado a mais, a razão inicial mudou consideravelmente. Aquilo que poderia ser “milagre”, “algo sem lógica”, por contrariar o “bom senso”, algo que não deveria ser aceito, passou a ser aceitável e lógico.

A razão, portanto e ao contrário do que muitos afirmam, é uma condição subjetiva[2], resultante da interação observacional do ser com o Universo, cuja existência é estabelecida pela observação dos fenômenos. A razão não é uma condição absoluta, mas relativa ao alcance mental de cada faixa perceptiva do Universo. A razão é um produto intelectual inerente ao mundo incompleto e limitado dos seres, ela nunca é a atualidade do verdadeiro mundo em essência. A razão somente atende àquele mundo que a espécie humana tem como “verdadeiro”, mas não atende a qualquer outra realidade fora dele. Como a verdade sobre o mundo está condicionada a interpretações e a análises limitadas, as relações entre nós e os objetos devem ser limitadas também, de modo que a razão nunca é plenamente confiável e indica necessariamente uma verdade dentro dos limites do intelecto, sob circunstâncias fenomenológicas flutuantes. Assim sendo, outros estados especiais de percepção não podem ser medidos segundo os padrões da lógica comum, pois são originários de outro patamar racional.

Na realidade, a razão é apenas um padrão mental de previsão de resultados. Resultados apenas das interações entre elementos objetivos, considerados “reais” no universo pessoal ou mesmo no coletivo, mas não no absoluto. A razão apenas é óbvia porque as pessoas possuem muitas percepções semelhantes, das quais resultam “realidades mais ou menos idênticas”. Além disso, ressaltemos que, mesmo em relação ao padrão de recorrência de determinado fenômeno em certa faixa vibratória do Universo, pode haver um grau expressivo de probabilidade da não-realização do fenômeno abordado. Então, sob este ângulo, visto que o ser não consegue perceber a totalidade quantitativo-fenomênica do evento mesmo em seu nível dimensional esperado, existe um relevante índice para o desvio imprevisível do acontecimento, supostamente eterno. Nesse sentido, a impossibilidade de um mesmo ser observar e analisar eternamente determinada lei natural confere ao evento certo caráter probabilístico, em última análise. Evidentemente, a lógica se nega a ver numa lei natural apenas um “alto padrão de recorrência”. Mas as observações nunca são totais, apenas parciais, no tempo, no espaço e na descontinuidade do limite perceptivo de cada nível mental. Note-se que não pretendemos negar a razão, mas sim deixar claro que ela é relativa àquilo que se observa, além de imperar apenas dentro de certos limites dimensionais, onde deve ser observada com rigor, porém, perde todo o seu significado ante outras realidades abordáveis, através, sobretudo, de estados psíquicos superiores. 

A razão é um guia para a análise intelectiva das relações entre os seres e os elementos do Universo, mas, mesmo nesse campo, ela deve ser aceita com certa cautela, porque não se conhece a natureza íntima das coisas. Possivelmente, muitas variantes existenciais não são consideradas, de modo que a lógica torna-se um fundamento racional parcial ou até duvidoso. Por exemplo, segundo a Física, portanto, segundo o “bom senso e a lógica aceita”, não se podem admitir velocidades superiores à da luz [300.000 km/s], de modo que tudo aquilo que parece ultrapassá-la deve ser descartado. Tudo o que se descreva em relação à velocidade acima daquele limiar é considerado “ilusão” ou “fantasia”. Mas, talvez, isso possa estar acontecendo, mesmo que “contrarie” princípios naturais aceitos pela Ciência, a qual tem se confrontado com situações que parecem contrariar o limite daquela velocidade. Existem alguns indícios da existência de partículas que se deslocam com velocidades superiores à da luz e, se for assim, devem existir outras leis, capazes de, no futuro, modificar os conceitos aceitos atualmente, mesmo sem invalidar, porém, os princípios da Relatividade. Isso é algo extremamente significativo, pois vem demonstrar que a razão não deve ser considerada “algo absoluto”, “imperando soberanamente em todas as situações”. Deve ser acatada somente dentro de certos parâmetros, os quais podem apresentar algum índice de variação. Embora possa haver velocidades superiores à da luz, mesmo assim, os postulados relativísticos não devem ser posto de lado. Na verdade, devem ser considerados como “exatos”, mesmo que relativos a determinadas condições fenomenológicas

A lógica é uma condição ligada a cada dimensão do Universo.[3] Determinamos as coisas, estabelecemos leis e princípios. Isso seria exato, se elas fossem totalmente conhecidas, em extensão e em profundidade; se todas as relações entre os elementos constitutivos do Universo fossem totalmente conhecidos. Então, a lógica que se estabeleceu a partir disso seria absoluta, portanto, incontestável. Mas, na verdade, temos apenas uma imagem muito tênue e diminuta do Universo, conhecemos somente uma pequena parte dimensional da existência, o que faz com que a lógica só deva ser aplicada aos limitados princípios observados. Esses princípios jamais esgotam a totalidade dos fenômenos universais. Como o ser humano só se dá conta daquilo que observa e concebe, a lógica conhecida serve apenas como base referencial para fenômenos materiais e energéticos que estejam dentro de restritos limites de observação.

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[1] A título de exemplo, no caso do planeta Terra, o nível de aceleração mínimo a partir do qual nenhum corpo consegue retornar [sem propulsores artificiais] é de 11,2 km/s.

[2] Objetivo: aquilo que pode ser detectado pelos sentidos ou por instrumentos. Subjetivo: aquilo que somente pode ser detectado pela mente. 

[3] Quanto às múltiplas lógicas conforme o nível de realidade, citamos, in extenso, as palavras de José Laércio do Egito, em trecho do tema 0.062 ["A razão e a lógica no Universo"]: "[...] Existem outras 'realidades'. No universo, há níveis existenciais distintos de tudo aquilo que Ciência oficial conhece, dos quais o místico não tem dúvidas quanto à existência. São outros planos de vida, situados bem além do patamar da matéria densa e que são tão reais quanto os citados. As coisas manifestáveis constituem o mundo material, que está representado pela Tríade Inferior da Árvore da Vida. Existe o plano astral [inferior], integrando a segunda Tríade da Creação. Também existe o mundo do intelecto puro, o mundo mental ou espiritual, integrando a Terceira Tríade, a Tríade Superior. A Cabala designa esses três mundos, respectivamente: MUNDO DIVINO DE ASSIYAHMUNDO DIVINO DE YEZIRAH e MUNDO DIVINO DE BERIAH.  Além desses três mundos, existe somente o mundo do Imanifesto, o mundo de onde tudo emana, pelo que é denominado também de MUNDO DA EMANAÇÃO, ou MUNDO DIVINO DE AZILUT. As leis físicas conhecidas e a lógica se aplicam apenas ao Mundo de Assiyah, [ou seja], ao mundo material, onde vivemos, integrando a Tríade Inferior, mas não se aplicam e nem sequer têm sentido nos mundos superiores."

Contato: peregrinisantiago@yahoo.com

Divulgação e restrição dos ensinamentos herméticos

PEREGRINI SANTIAGO

"Os lábios da Sabedoria estão fechados, exceto para os ouvidos do Entendimento.”
— O Caibalion.

Há muito tempo, constatamos que, não todos, mas a maioria dos estudantes do misticismo ainda não consegue perceber a importância maior da transcendência da matéria e até mesmo do ego e dos seus alegados "poderes desenvolvidos". Quando entram em contato com as Ordens ou outras organizações afins, quando começam a estudar os fenômenos psíquicos (telepatia, pré-cognição, projeção astral, etc.), se dão conta de que tais práticas sempre estão ao alcance, pois somos seres mentais. Assim, tendem com frequência a ficarem progressivamente fascinados com o despertar de muitos dos poderes até então latentes.

Diversos estudantes, fascinados, veem nas práticas místicas possibilidades de não apenas desenvolverem outros níveis de suas percepções, mas também de se crerem "superiores" aos outros, eventualmente desejando subjugá-los! Por estarem em tão intenso envolvimento com os poderes do ego, os quais, porém, são ilusórios, de modo a recrudescerem a prisão na existência, passam a intensificar a busca não como um meio para se libertarem das ilusões e sofrimentos impostos pela mente, mas sim como formas para se destacarem em seus pretensos poderes. Isso ainda ocorre na maioria dos casos. 

São poucos aqueles que já perceberam que, embora o despertar dos poderes psíquicos seja relevante para, por exemplo, expandirem a percepção e vivenciarem intensamente a multidimensionalidade do Universo, o mais relevante é a superação de todos os envolvimentos gerados pelo ego, isso incluindo a superação da busca de benesses pessoais por poderes desenvolvidos. A este respeito, sabemos que toda cautela é relevante, pois os conhecimentos místicos ainda não apenas são incompreendidos por muitos, como também distorcidos. Nesse sentido, a preservação estratégica desses conteúdo é sempre razoável, sem, porém, indicar restrição absoluta, pois a Sabedoria Arcana pertence à Humanidade, não a esta ou àquela organização.

Há séculos, inspirados por determinadas egrégoras, determinadas pessoas têm atuado neste planeta objetivando não apenas transmitir elevados conhecimentos metafísicos, mas também orientar estudantes. Sabemos que atualmente existe uma discreta organização místico-filosófica que tem atuado discretamente no planeta Terra para transmitir elevados ensinamentos aos sinceros busca-dores. Para tanto, tem utilizado determinados meios de transmissão dos ensinos, os quais não são os mesmos, devido a alguns fatores didáticos, parte dos quais expomos rapidamente neste texto. Antes, falamos, sem entrar em maiores detalhes, a respeitos dos "tipos" de organizações místicas, quanto às maneiras pelas quais concebem como devem transmitir seu conteúdo. Temos o conhecimento de determinadas organizações místico-filosóficas cuja transmissão dos ensinamentos ocorre de modo mais restrito, mas existem também aquelas que prezam pela divulgação irrestrita dos conhecimentos transmitidos, assim como as que são intermediárias nesse sentido, pois não são fechadas de fato, nem abertas.

A este respeito, atua uma Ordem hermética que zela pela sua não-exposição nominal, nem mesmo pelas mídias convencionais (internet, revistas, etc.), porque seus objetivos maiores ainda não devem ser revelados às pessoas em geral, ainda não preparadas para entender e aceitar o trabalho. Ao mesmo tempo, essa hiper-discrição age como uma das formas de evitar exposições inoportunas e até mesmo perigosas. Então, neste caso, falamos de uma Ordem "hiper-discreta", ou, simplesmente, "secreta". Existem outras, porém, que são conhecidas do público, se fazem revelar pelas mídias. Mesmo assim, são instituições parcialmente expostas, porque zelam pela proteção de seus rituais internos, de determinados ensinamentos transmitidos e também de seus membros, por motivos variados, inclusive relacionados a perseguições dogmáticas. Como, neste caso, são organizações divulgadas, não são, portanto, "hiper-discretas" ou "secretas", mas, "discretas" ou "semi-secretas".

De fato, como dissemos, existem grupos herméticos em atividade. Além daqueles que não se expõem publicamente, sabemos de alguns que atuam em variadas mídias. Mesmo na internet, por exemplo, em redes sociais, existem grupos sérios, embora ainda sejam tão poucos. Nessa mídia, a maioria dessas organizações se faz sentir claramente, em status "público" ou até mesmo "fechado", mas, em ambos os casos, sendo visíveis pelas pessoas em geral. Contudo, nesse espaço, existem alguns grupos, bem mais restritos, os quais decidem pela maior restrição da sua visibilidade nas mídias em geral, mesmo em redes sociais. Optam, por conseguinte, por agirem em status "secreto", devido a determinados motivos, a saber: i) Na presente humanidade, a maioria das pessoas ainda está profundamente enraizada em suas variadas crenças, tomando-as amiúde como "realidades absolutas"; ii) Pelo primeiro motivo, no atual as crenças, sobretudo quando consideradas muito "diferentes" dos ensinamentos herméticos, tendem a gerar intensos choques existenciais na pessoa, o que certamente perturba sobremaneira sua pretensa sanidade mental; iii) A maioria das pessoas apresenta fraquíssima base de estudos filosóficos genéricos e científicos, motivo pelo qual reforçam suas crenças doutrinárias, o que, no Hermetismo, não ocorre, devido ao alto teor de desconstrução-reconstrução conceitual da análise, a qual com frequência dialoga com a ciência oficial, mas eventualmente contestando-a; iv) A Conjura do Silêncio[1], que desde os derradeiros momentos da Atlântida platônica[2] tem atuado neste planeta, ainda considera os ensinamentos herméticos "perigosos" para a manutenção dos interesses de manipulação e alienação comportamental da sociedade. Além disso, ocultamente a serviço de forças detratoras interdimensionais, a Conjura tem procurado reforçar a ignorância das pessoas diante dos ensinamentos que transmitimos para, assim, mantê-las presas à "roda das encarnações", mormente motivada pela sensação de "culpa pessoal".

A Conjura tem especificamente atuado no sentido de gerar o medo e a culpa nas pessoas, os quais são aliados da ignorância. Temos conhecimentos de ataques constantes da Conjura contra aqueles que ousam não apenas a estudar o Hermetismo, mas também a transmiti-lo. Os grupos que resolvem ensinar esses conhecimentos, sobretudo quando são mais conhecidos do público, tornam-se mais propensos às investidas espúrias do Obscurantismo. Por isso, essas organizações místicas geralmente optam por ensinar em uma reserva ainda maior do que a normalmente considerada, de maneira a os preservarem e a conseguirem transmiti-los às gerações vindouras.

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[1] A "Conjura do Silêncio, ou "Obscurantismo", representa os interesses pessoais, em praticamente todos os ramos da sociedade, no sentido de não divulgar e até mesmo eliminar determinados ensinamentos, sobretudo os que versam sobre a escravidão mental do indivíduo e sobre como libertar-se desse condicionamento.

[2] A "Atlântida platônica" simboliza os derradeiros anos em que floresceu essa civilização, tal qual foi descrita por Platão [427-348 a.C.], na obra Timeu e Crítias.

Contato: peregrinisantiago@yahoo.com

Os Dois Princípios Cósmicos

JOSÉ LAÉRCIO DO EGITO  F.R.C.

"É absolutamente necessário que nos persuadamos da existência de Deus, 
mas não é igualmente necessário que o demonstremos".
— I. Kant.
Tema 5
1976 - 3329

No Cosmos[1] somente existe uma “essência” suscetível de vibrar, que é inerente ao Ser Supremo. Aquela “essência” vibratória constitui tudo o que existe, embora ela não revele diretamente a sua própria natureza, por isso a sua existência ainda não é suspeitada pela ciência atual. Trata-se de algo indetectável, tanto direta quanto indiretamente. Porém, mesmo que a sua verdadeira natureza ainda seja desconhecida, é possível se ter ideias de alguns dos seus atributos[2]. Sabe-se que essa essência é o princípio de tudo aquilo que existe, quer em nível material, quer em nível energético. Alguma coisa só se manifesta quando ela entra em vibração, e, no Cosmos, aquela “essência” é unicamente o que é passível de vibrar.

Tomemos um exemplo analógico para facilitar o entendimento do que vamos expor. Suponhamos uma lâmina metálica flexível presa por uma de suas extremidades a um suporte, e apliquemos nela uma pressão sobre a outra extremidade. Em seguida, liberemos ela bruscamente. Então, aliviada da flexão, a lâmina começará a oscilar – vibrar. Com a lâmina em repouso nada acontece, porém, se uma força atuar desviando uma das extremidades da posição de repouso, ela começará a vibrar, e, conforme o número de oscilações por segundo, haverá a produção de um determinado efeito sonoro. Se fosse possível ir aumentando indefinidamente as oscilações da lâmina, depois do som iriam aparecendo outras das manifestações existentes no Universo; desde as radiações até a própria matéria. Um elétron é algo que vibra 10²³ (1 seguido de 23 zeros) vezes por segundo. Quando a lâmina estivesse vibrando nesse imenso número de vezes por segundo, ela emitiria tão somente elétrons (evidentemente que uma lâmina metálica não se prestaria para uma experiência dessa natureza, porque ela não suportaria tal nível de oscilação). Para muitos níveis de vibração, existem dispositivos adequados para detecção de muitos índices vibratórios. A própria constituição material da lâmina nada mais é do que o resultado da oscilação de alguma outra coisa.

Do que foi dito surgem as seguintes indagações:
1ª) Qual o elemento vibrante absoluto, aquilo que vibra para que tudo possa existir?
2ª) O que impulsiona esse elemento?

No exemplo da lâmina em oscilação, temos a considerar:
A – Um agente ativo (uma força) capaz de iniciar ou de alterar a frequência das oscilações de outro elemento.
B – Um agente passivo que oscila, que vibra (no exemplo é a própria lâmina).
C – Um som resultante da interação desses dois elementos.

Em resumo: No Cosmos há um meio básico, cuja natureza íntima não podemos entender, apenas podemos descrever como um princípio básico suscetível de vibrar sob a ação de um elemento ativo, que determina a vibração, e originando sempre alguma coisa, cuja natureza depende unicamente da frequência oriunda daquela interação.

O querer compreender o Poder Superior, o Absoluto, em sua totalidade, é impossível à mente limitada dos seres, desde que estes têm natureza relativa, e o relativo não pode compreender o absoluto; a parte não pode entender o todo. Mas, mesmo assim, se pode ter ciência de alguns dos atributos do Absoluto. Mesmo que não saibamos, em essência, o que seja esse “meio básico primitivo”, é possível conhecer alguns dos seus atributos. Já sabemos que a “essência” é a geratriz de tudo que existe, desde que algo seja capaz de movimentá-la, de fazê‑la vibrar com uma frequência adequada.

Consideremos a “essência” como sendo um princípio passivo (passivo porque ela necessita de outro agente para fazê-la vibrar, necessita de um agente ativo para com ele interagir). A vibração do elemento passivo é a causa geradora de todas as coisas existentes. No exemplo que demos anteriormente, chamemos a lâmina de condição B, e aquela força que a faz vibrar de condição A. Da ação da condição A sobre condição B – a lâmina – surge o som, que é a condição C. Para que exista o som – condição C – faz-se necessária a interação entre as duas condições – A/B → C.

O que faz as coisas parecerem-se diferentes entre si é tão somente a variação entre suas frequências vibratórias. Em princípio o universo tem somente dois elementos primordiais: um é aquele algo que vibra e o outro aquele algo que determina a vibração, portanto podemos considerar um ativo e o outro passivo.

Antes do início das coisas criadas, só existia o “NADA” – Inefável – no qual as duas condições mencionadas estavam contidas. Isto, na simbologia numérica, é o absoluto, o “zero”. Assim, podemos dizer que no “Zero” existem, em potencial, três atributos: Um ativo, outro passivo, e mais um terceiro que promove a interação dos dois outros. O terceiro princípio, que faz com que os dois outros princípios interajam entre si, é considerado como o Querer Cósmico. Por isto se pode dizer que é da interação desses três “Atributos Primordiais” que resulta o Universo Imanente – Mundo Creado.

Existe uma gravura esotérica (figura 1) muito antiga, que mostra um instrumento de uma só corda – Monocórdio. Conforme se pode ver na figura, em torno do instrumento há inúmeros semicírculos, onde estão inscritas as várias forças da natureza, em suma, onde está explícito tudo o que existe, quer como formas materiais, quer como forças naturais. De uma nuvem sai uma mão que aperta a cravelha do instrumento. À medida que se aperta a cravelha do instrumento, a corda vai se tornando mais tensa, e, consequentemente, sendo emitidos sons cada vez mais agudos. O apertar a cravelha equivale a emitir vibrações de frequências mais elevadas. Se fosse possível a existência de tal “monocórdio cósmico”, capaz de gerar todas as vibrações possíveis, na medida em que fosse sendo aumentada a tensão da corda, iriam surgindo seguidamente: sensações táteis, som, luz, ondas radiofônicas, ondas de televisão, micro-ondas, radar, prótons, elétrons, matéria, e mais todos os níveis de emanações cósmicas. Em suma, todas as coisas que existem no universo iriam surgindo, na medida em que a frequência fosse progressivamente aumentando.

No exemplo do monocórdio, a corda corresponde à condição DOIS, a mão que aperta a cravelha à condição UM, e o resultado disto a condição TRÊS. Já aqui temos também uma trindade, porém já de nível inferior, material.

O universo teve o seu Arquiteto, teve uma origem a que chamam de DEUS, e não somos tão ingênuos a ponto de tê-Lo como um ser antropomórfico – de forma humana – e muito menos de admitir que Ele, para construir o mundo, empregou as mãos ou quaisquer instrumentos. Sabemos que Ele o construiu com o poder de Sua vontade, com o poder daquilo que podemos chamar de QUERER DA MENTE[3] DIVINA. Foi o “QUERER CÓSMICO” quem atuou sobre a “Essência Cósmica”, fazendo-a vibrar, e originando assim tudo o que existe.

QUERER DE DEUS (CONDIÇÃO UM)  ESSÊNCIA DE DEUS (CONDIÇÃO DOIS) = CONDIÇÃO TRÊS (UNIVERSO CREADO).

Eis uma das razões pelas quais o número três, e sua representação gráfica – o triângulo – são sagrados para diversas Escolas Místicas. O princípio ativo do Creador – ponto UM – agente ativo (primeiro vértice do triângulo), agindo sobre o elemento dois – Essência Primitiva, passiva – segundo vértice do triângulo – gerou as coisas existentes constitutivas do Universo.

Como se pode notar, a mais elevada das Trindades tem necessariamente o vértice para cima, enquanto que o triângulo representativo das coisas criadas tem o vértice para baixo. (Vide o desenho.)

Pelo que dissemos, é fácil se entender por que os antigos místicos diziam ser o triângulo uma representação sagrada do Ser Supremo, por nele estarem explícitos os dois princípios cósmicos da Divindade e a Sua manifestação.

Os antigos já diziam que o Supremo Creador era masculino e feminino, para algumas “Escolas de Mistérios do Antigo Egito” RA e MA configurando NUT. Com isto não queriam dizer que Deus fosse um ser bissexual, hermafrodita, como afirmam alguns que não compreendem as coisas em níveis mais elevados, mas sim um Poder Absoluto manifestável pela interação de dois princípios básicos – RA e MA.


O PRINCÍPIO FEMININO (MA)

Já temos condições de sentir que, antes da existência das coisas creadas no universo, já havia algo integrante do próprio Creador. Existia uma quantidade ilimitada de MA, algo suscetível de vibrar, do qual se originaram todas as coisas. No universo, na realidade, em essência só existe MA. As coisas, por mais diferentes que sejam, basicamente são uma só, e toda diferença se deve apenas ao nível de vibração, portanto MA é a geratriz (= geradora, mater, mãe) de todas as coisas existentes, e que, por ser geradora, pode ser considerada uma qualidade feminina do Supremo Ser – Mater Cósmica – Mãe Cósmica.

Antes de o universo detectável existir, quando só existia MA, não podia haver fluxo de tempo, porque não havia fenômenos de quaisquer naturezas para serem medidos, fenômenos para serem situados, localizados, e, consequentemente, a ideia do fluir do tempo. Também não podia haver espaço por inexistir qualquer coisa para ocupá-lo. Como consequência da inexistência do “fluir do tempo”, MA não pode haver tido princípio, pois tempo é função do espaço, e espaço é função das coisas existentes nele. O tempo relativo não pode fluir sozinho num universo vazio, pois não é ele quem “passa”, quem “flui”, e sim as ocorrências.

Essa ideia de eterno que afirmamos para MA – também para RA – é muito difícil de ser descrita, mas o iniciado pode sentir isto em meditação ou em outro estado ampliado de consciência. MA sempre existiu, mas, antes da creação, no universo, nada acontecia, nenhuma coisa, nenhum fenômeno, nenhum evento se fazia presente. Não havia eventos, não havia percepção de tempo, e, não havendo a percepção de tempo, só restava o Eterno, o Imutável, o NADA – origem, princípio, geratriz, natureza atemporal e inespacial. Imperceptível por não haver meios de detecção e nem consciência individualizada para registrá-lo.

Antes que as coisas existissem, existia o Poder Superior, compreendendo uma “Matriz Geradora” = MA, e um “Poder Gerador” = RA, manifestando-se em uníssono, formando uma Trindade Transcendente, uma das que existem além do nível da Creação, primeira das Trindades existentes. Como o UM é a origem geradora de tudo, com certeza RA e MA podem ser considerados como “inerências”, “atributos” do próprio Poder Superior. Numa analogia singela, podemos dizer que são como três palitos de fósforos unidos em uma só chama. São TRÊS em existência, e apenas UM em manifestação; três fósforos e uma só luz.

No exemplo que demos no início, usamos uma lâmina metálica para explicar o processo das vibrações gerando todas as coisas. Vimos que uma lâmina metálica naturalmente não pode gerar todas as frequências possíveis, tal como qualquer outro material ou instrumento, porque a própria matéria já é o resultado de algo que vibra. Mesmo que hipoteticamente um instrumento material gerasse todas as frequências, ele não poderia gerar a frequência de si mesmo, pois coisa alguma gera a si própria. Sabe-se que coisa alguma é capaz de gerar a si própria, uma coisa sempre é gerada de outra, um efeito sempre tem uma causa, isto é a regra. Por certo, a geratriz básica primitiva não teve início, nunca foi gerada, assim ela deve ser totipotente, por ser capaz de vibrar na frequência de qualquer coisa, tanto podendo criar quanto modificar tudo quanto há.

Com este raciocínio chegamos inevitavelmente à ideia de MA. No exemplo da lâmina, MA corresponderia à lâmina onde primeiro surgiria a sensação táctil, a seguir a sensação sonora, e, à medida que a frequência – número de oscilações por segundo – fosse aumentando, iria surgindo tudo o que existe.

Antes do início de tudo, havia uma situação de repouso, apenas em estado potencial, sem vibração alguma, portanto sem coisa alguma. Em tal condição, nada podia existir, nenhuma creação. A rigor, não se pode empregar a palavra “nada”, pois algo evidentemente existia, de forma imanifesta. Existia a “essência”, mesmo que ela fosse totalmente indetectada, desde que não se manifestava de forma alguma, pois qualquer manifestação é resultante de alguma alteração ou da geração de alguma frequência da Essência Básica. Não havendo variação de frequência, nada poderia ser detectado por quaisquer meios habituais. Algo que não se manifeste por quaisquer meios é como se não existisse, mesmo existindo – Vazio Quântico. Portanto, antes da Criação do Universo, a “Essência” existia em certo sentido, mas era totalmente imanifesta, inconcebível para nossa compreensão, portanto comportando-se como algo inexistente, como um nada.

Uma ideia bem singela, que pode ser tomada como analogia, é o ar. Percebe-se o ar pelos seus efeitos quando ele é agitado, movimentado. O ar parado é praticamente indetectável sensorialmente. Devemos entender que até o ar respirado só e detectável pelo movimento imposto pelo tórax.

Para concluir, diremos que toda forma de existência deriva do NADA, portanto o NADA é TUDO e o TUDO é NADA. Dentro do Universo podemos dizer que tudo tem origem no UM, portanto que UM é Tudo e Tudo é UM.

Além do Universo, Tudo é ZERO em sua realidade absoluta, em sua essência íntima e fundamental. Por outro lado, dentro da Creação, “tudo está contido e sustentado pela unidade, tudo se conserva, vive e existe pelo UM; tudo se dissolve e desaparece na Unidade.” (Citação de A. Levini.)

Se não entendermos bem a base metafísica do Universo, é impossível entender também o esoterismo, a ciência de DEUS; por esta razão, antes de iniciarmos nossos estudos esotéricos de nível elevado, numa série grande de palestras, inicialmente, apenas estudaremos a natureza das coisas e os sistemas místico-religiosos.

A pessoa que não tiver um mínimo essencial de conhecimentos esotéricos não pode entender os grandes mistérios, nem sequer entender certos textos em que tudo é descrito de uma forma que mais parece um jogo de palavras.

Quando nada existia, já havia MA e RA. Não há o vazio absoluto, pois sempre há MA. Em um “local” qualquer do Cosmos, mesmo que qualquer coisa ali não se manifeste, ainda assim existe a “ESSÊNCIA PRIMEIRA” – MA.


O PRINCÍPIO MASCULINO (RA)[4]

Este princípio[5] apenas pode ser sentido e não descrito. Descrevê-lo é algo impraticável. Para explicar o Princípio “Feminino” é possível se fazer uso de alguma analogia, como a da lâmina, por exemplo, mas, para explicar o Princípio Ativo – RA – não se dispõe de um exemplo adequado, desde que coisa alguma se presta para transmitir, mesmo que vagamente, aquilo que representa RA. Somente no exemplo da lâmina, ou do monocórdio, temos uma vaga compreensão daquele princípio. No máximo podemos dizer que RA seria a força impulsora que toca a corda, ou que flexiona a lâmina.
Sabe-se que RA é uma condição capaz de provocar ou de alterar a vibração de MA, portanto pode ser definida apenas como uma “força”, assim ela é Um Poder Superior em manifestação.

Sabe-se que a creação é tudo aquilo de que se tem consciência[6], e só aquilo que vibra é passível para ser, de alguma forma, evidenciado. Portanto, para nós, a creação é MA em diferentes níveis oscilatórios, e a causa impulsora determinante das vibrações é RA, um dos Princípios atribuídos a DEUS. Portanto DEUS + RA + MA formam uma das primeiras e maiores Trindades. Mas, embora se apresentem como três aspectos, na realidade dois deles – RA e MA – são aspectos, são qualidades, da própria natureza do Poder Superior.

Concluindo esta palestra, diremos que, em essência, não se sabe o Que é o Princípio Cósmico RA citado, porém podemos, limitando-o, compará-lo com o Querer Divino, partindo do seguinte raciocínio: O Supremo Creador não utilizou qualquer órgão, ou instrumento, para efetivar a creação, portanto o impulsor da criação foi o puro Querer.

“FAÇA-SE A LUZ E A LUZ FOI FEITA.”  A Consciência Cósmica creou a partir dela própria, pela ação de RA sobre MA.

Antes daquele momento que a ciência chama de “Ponto de origem do Big Bang”, e que as doutrinas místicas chamam de “Fiat Lux”, coisa alguma existia do que se pode racionalmente conceber. Por mais que se tente entender sobre a causa primeira da existência, o máximo possível é dizer que algo Inefável – aquilo que não se pode definir – sempre existiu.

Por várias razões, que serão estudadas em muitas palestras, será enfocada alguma hipótese, faremos algumas conjecturas de por que o Inefável haver se tornado manifesto, mas antes é preciso que muitos conhecimentos preliminares sejam transmitidos.

Esquematicamente, podemos dizer que, visando um entendimento preliminar, o processo da creação pode ser representado conforme a figura 2.

Quando a vibração de MA se fez sentir, então se estabeleceu a creação. Creação implica em se designar algo, e, no caso considerado, é tudo aquilo que compõe o mundo. Naturalmente que no “primeiro momento” – como afirma a própria ciência – tudo quanto existe no mundo estava contido num ponto, assinalado na figura como “Fiat Lux”, a partir do qual houve uma expansão – espaço – no qual todas as coisas se situaram.

A expansão a partir do Fiat Lux[7] não ocorreu de forma aleatória, ela se fez segundo uma sequência sétupla, processo que pode ser representado pelo clássico esquema conhecido pelo nome de “Árvore da Vida”.

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[1] A V∴O∴H reserva os termos Universo – para indicar o mundo creado, este mundo surgido após o “Big Bang” = “Fiat Lux”, e Cosmos – para indicar a totalidade, o creado e o increado. Quando fala de dois mundos, o faz apenas como forma didática. Considera “Mundo Transcendente” – o que transcende à creação – e o “Mundo Imanente” – o que existe como resultado da creação. O termo cosmos representa os dois mundos juntos.

[2] A ciência oficial já esteve bem perto de registrar esse conhecimento, quando foi aventada a hipótese do “ÉTER UNIVERSAL”, posteriormente afastada.

[3] O termo “mente” não é bem adequado para expressar o Poder Creador, pois, no mais alto nível, a rigor não existe qualquer atributo que possa caracterizar uma mente. Isto nós veremos em temas futuros.

[4] Falamos de Princípio Masculino e de Princípio Feminino, mas deve ficar bem claro que isto nada tem a ver com o sentido de sexualidade, não são sexos de Deus, e sim polaridades abrangentes, das quais o sexo é parte mínima.

[5] A palavra “Princípio” não tem aqui o sentido de lei física, mas sim de algo primordial.

[6] A V∴O∴H não usa este termo apenas no sentido de “se dar conta de”, mas também no de existir como coisa. A consciência sempre está presente, desde uma partícula até o macrocosmo. Tudo é constituído de consciência, expressa sob um incomensurável número de formas.

[7] Representado na “Árvore da Vida” pelo sephirah KETHER.

O que é real?

JOSÉ LAÉRCIO DO EGITO  F.R.C.

"É mais sábio aquele que duvida..."

Tema 56
1976- 3328

Sábio é aquele que duvida, assim começamos esta palestra. Somente através da dúvida é que muitas vezes se pode chegar à verdade.

Através do tempo muitos pensadores tiveram grande dificuldade em afirmar algo como uma realidade. Para um pensador, mergulhado na análise filosófica dos problemas do Universo, o sentido de realidade é tão sério que os orientais filiados a algumas correntes de pensamento chegam a dizer que este mundo é o mundo de Maya, o mundo das ilusões, o mundo onde nada é verdadeiro. Para outros, o Universo nada mais é do que uma forma de pensamento, uma ideia na Mente de Deus. Tudo isto não é tão absurdo quanto parece ser. Para um pensador que não tenha conhecimentos profundos de metafísica é fácil enveredar por um caminho que necessariamente o levará a tirar conclusões de que vivemos num mundo irreal, num universo de ilusões. Tanto é assim que o grande filósofo e matemático René Descartes chegou a duvidar metodicamente de tudo, e julgar importante e possível vencer a dúvida, evitando-a. Usou, para chegar à certeza, o caminho da dúvida, o que o levou à admissão do “Cogito, ergo sum” (Penso, logo existo).

Começaremos afirmando que nada é mais falho do que as definições de dicionários e enciclopédias sobre o significado de Realidade: Realidade é aquilo que existe efetivamente. Esta definição nos leva a uma pergunta: O que existe efetivamente? Como se ter a certeza de que algo existe? A definição ficaria mais completa assim: “Realidade é aquilo que existe efetivamente em nossa consciência objetiva”.

Quando começamos a analisar subjetivamente qualquer fenômeno, como o fazem os místicos e pensadores, surge uma seqüência de dúvidas sobre a realidade das coisas.

Na Idade Média surgiu um movimento filosófico que considerava o conhecimento do mundo exterior como realidade objetiva e que se denominou REALISMO. Claro que aquele sistema ruiu facilmente diante de uma linha de raciocínio mais profundo porque, diante de fatos da vida real, ele se mostrou inadequado. O alvorecer da ciência atual completou a destruição daquele sistema, pois a própria ciência lançou esplêndida parcela de dúvidas sobre a quase totalidade dos registros objetivos, que no passado somente eram feitos através dos sentidos físicos. Foram as descobertas científicas que demonstraram que os registros sensoriais pouco significam, que eles são errôneos em grande parte.

Procuraremos inicialmente situar o problema dentro dos conhecimentos referentes às manifestações vibratórias e por certo poderemos tirar conclusões deveras interessantes. Tudo aquilo de que tomamos consciência no mundo material chega ao cérebro através de ondas de natureza vibratória e, graças às variações de frequências, é que dizemos: ouvimos algo, vemos algo, sentimos algo, etc. Escolhamos algo para análise. Aquilo que tomarmos em consideração emite vibrações para os nossos órgãos sensoriais, do contrário não detectaríamos nada e aquilo não existiria para nós. Conforme o órgão que detecta as vibrações é que o cérebro registra um som, uma cor, uma forma, etc.

Se quisermos analisar mais profundamente aquele emissor chegaremos logo à conclusão de que ele não emite apenas aquelas radiações que detectamos diretamente. Suponhamos um aparelho de rádio. Ele transmite ondas sonoras aos nossos ouvidos, mas paralelamente ele emite também outras vibrações indicadoras de cor, de temperatura, da sua forma, e muito mais coisas que simultaneamente são transmitidas e não são conscientizadas.

A ideia que fazemos de um objeto qualquer é o resultado do somatório das vibrações detectadas, mas isto não indica que temos consciência total de tudo o que é emitido. Disto advém que nunca temos consciência completa de um objeto, mas tão somente consciência de algumas informações fragmentárias.

No comentário que fizemos a respeito das características das manifestações vibratórias, dissemos que vivemos mergulhados num turbilhão de ondas das mais diversas frequências, e que um emissor nunca emite somente uma mensagem vibratória, uma informação única e isolada. Citamos que um transmissor de rádio não transmite somente ondas sonoras, pois alguém que estiver perto dele verá a sua forma, sentirá o calor do aparelho, etc., e, se alguém fosse dotado de outros órgãos sensoriais, registraria muito mais coisas. Isto ocorre porque temos poucos órgãos sensoriais, que nos levam a ter ciência apenas de uma parcela da natureza do emissor.

Outro ponto que vale ser assinalado diz respeito à conscientização de um mesmo evento procedida através de órgãos sensoriais diferentes.

Consideremos uma corda de um instrumento musical. Ela produz unicamente vibrações que são detectadas pelo órgão da audição, e no cérebro se processa a conscientização de som. Contudo, se a mesma corda tivesse contato com alguma parte do corpo a pessoa sente como que um “tremor”, uma vibração. Assim a corda está produzindo uma mesma coisa, mas que é conscientizada como sendo duas diferentes. Isto decorre de haver sido captada por dois órgãos sensoriais diferentes. Perguntemos o seguinte: O que é um som para um surdo, desde que ele sinta o fenômeno através do tato? É fácil compreender que ele sente algo totalmente diferente daquilo que uma pessoa comum que usa a audição sente.

No exemplo que demos antes, o que seria aquela corda vibrante para um hipotético ser de visão “ciclópica” que visse além da estrutura atômica? Na realidade ele veria apenas uma “essência” vibrando. Podemos dizer que a consciência que temos de um fenômeno depende diretamente da natureza do órgão receptor. Vimos que uma corda vibrante, com um determinado tipo de detector como o ouvido, permite a conscientização de som; com outro, o tato, a conscientização da vibração mecânica.

Pelo que estamos mostrando, podemos sentir como é difícil se estabelecer uma definição clássica para o que significa real. Acreditamos efetivamente que só existe uma coisa real no mundo creado: Vibração da essência das coisas; tudo o mais é fruto do tipo de detector que dispusermos. Pelo exemplo anterior podemos dizer que nem o som e nem a sensação táctil são realidades absolutas. Neste fenômeno o que inegavelmente mais se aproxima do real é a vibração.

Ante um evento que detectamos como cor, odor, sabor, som, etc., nada disto é real, são apenas sensações mentais diferentes de uma mesma coisa por captação por órgãos sensoriais diferentes. No exemplo dado antes é som e sensação táctil porque a pessoa só tem dois tipos de órgãos detectores para registrar o evento, mas, se tivesse outros órgãos diferentes do da audição e do tato, por certo uma coisa bem diferente seria conscientizada.

Para uma pessoa que fita o firmamento, o Universo é aquele esplendor de luz registrado pela visão. Ele se apresenta, então, como um amontoado fantástico de pontos luminosos. Enquanto isto, para um astrônomo num telescópio, ele é algo bem maior e muito mais rico em pontos luminosos e, graças à decomposição do espectro da luz com prismas especiais acoplados ao telescópio (espectroscópio) o Universo passa a ser algo bem diferente, pois tudo fica cheio de cores. Usando-se os recursos da fotografia com filmes especiais sensíveis ao infravermelho e ao ultravioleta, o Universo toma um sentido bem diverso apenas por se mudar um tipo de conversor que possibilitou a percepção de freqüências (I.V. e U.V.) antes não assinaladas. Enquanto isso, mesmo o universo para um cego de nascimento não passa de uma coisa que tem calor e solidez sobre o que ele vive e caminha.

Se o mais habilitado dos astrônomos do passado fosse a um observatório e ali visse as análises astronômicas da atualidade feitas por inúmeros aparelhos, se visse os traçados efetivados por um radiotelescópio, etc., por certo ele não reconheceria aquilo como um observatório astronômico. Em vez de uma abóbada repleta de pontos luminosos ele veria um amontoado de papéis, de registros gráficos, de imagens em telas de computadores. Assim sendo, para um radioastrônomo, o universo apresenta-se bem diferente de como se apresenta para um astrônomo ótico. Para um, uma miríade de luzes, e, para o outro, uma sucessão de riscos gráficos e sons com os quais ele mentalmente constrói um modelo mental, ou um computador monta uma imagem. Num observatório astronômico moderno há registros de corpos que só são detectados por ondas de Raios X, por radiações gama, etc. Assim sendo há um universo “inexistente” sensorialmente, pois diretamente não é detectado nenhum daqueles corpos que o são pelos sistemas citados. Na verdade o universo não é esse modelo que vemos, nem sequer aquele que um astrônomo ótico vê, nem aquele que um radioastrônomo registra, e por certo nem mesmo o que vier a ser percebido por outros sistemas.

Agora pensemos qual seria a conceituação de universo para as diferentes categorias de astrônomos se não houvesse um consenso entre as especialidades, se não ocorressem deduções comparativas de leis que regem os vários ramos especializados? Por certo a opinião dos diferentes tipos de astrônomos seria totalmente diferente.

Um objeto qualquer só é reconhecido como tal, como sendo uma mesma coisa por diferentes pessoas, se estas forem dotadas de órgãos receptores semelhantes. Assim sendo, um determinado objeto, por mais usual que seja, seria de difícil reconhecimento à primeira vista para alguém que, de um minuto para outro, fosse agraciado com mais sentidos físicos novos, capazes de interceptar outras irradiações. A conscientização requereria deduções mentais para uma identificação precisa, pois todas as características de um determinado objeto seriam diferentes.

Sabemos que as serpentes percebem os seres vivos graças a um órgão situado na fosseta loral (órgão sensorial especial daqueles répteis). Naquele ponto a onda infravermelha do calor animal é convertida em percepção pelo cérebro. Assim a serpente percebe, de uma forma totalmente diferente da visão, os seres vivos, onde não é possível a percepção humana detectar. A exata sensação decorrente daquela percepção é algo inconcebível para nós humanos. Para um ser humano que fosse dotado de um órgão semelhante àquele, qual seria a imagem mental de outro ser humano que ele observasse? Detectando os raios infravermelhos do corpo a imagem seria bem diferente, pois haveria um halo de irradiação em torno da imagem visualizada que se estenderia por um espaço amplo, interpenetrando-se com outros halos, numa situação que nos é impossível sentir.

Com o exemplo acima consideramos apenas o acréscimo de um órgão, e então indagamos: o que ocorreria se fossem vários órgãos com diferentes capacidades?

Pensemos agora na imagem mental criada por um cachorro que dispõe de um órgão olfativo altamente desenvolvido.

Para um biólogo é fácil pensar nas inúmeras possibilidades das diferentes espécies no campo das percepções.

A maior parte dos animais não tem visão binocular – que forma uma só imagem pelos dois olhos – e, portanto, não conta com a visão de profundidade – em 3 dimensões – e as imagens conseqüentemente são planas. Também a grande maioria deles não dispõe da visão colorida, portanto só isto basta para eles terem um mundo em preto e branco, portanto bem diferente do mundo colorido visto pelos seres humanos. Para um ser humano uma paisagem parece algo bem mais completo, desde que os olhos humanos possuem detectores especiais para a visão em cores. Somente por dispor desses detectores aptos para certos comprimentos de ondas na faixa das cores a imagem já é conscientizada de forma diferente daquela como é feita pelos animais.

Pensemos um pouco como são as percepções visuais dos seres aquáticos, que vivem em baixo da água onde ocorrem todos os tipos possíveis de refrações luminosas. É fácil se perceber que lá as formas das coisas têm aspectos completamente distorcidos como resultado da refração luminosa. No reino animal existem seres que são cegos, que não têm órgão da visão, como certos peixes que vivem em cavernas, como os que têm a visão atrofiada que em nada contribui para eles perceberem as coisas, mas que, em compensação, são dotados de uma excepcional acuidade de outros órgãos.

Conhece-se bem um órgão sensorial de que os morcegos são dotados. Trata-se de um órgão que emite um som de alta frequência que, ao incidir sobre um obstáculo, é refletido e detectado pelo ouvido que dispõe de acuidade adequada para isto. É uma espécie de radar. Certos cetáceos emitem e percebem ultrassons, micro-ondas e coisas assim. Pensem no como se apresenta o mundo para eles.

Os olhos das moscas e de outros insetos são compostos, são milhares de olhos independentes, cada um deles captando uma imagem própria. Assim chegam ao cérebro simultaneamente imagens múltiplas de uma mesma coisa. Vale pensar como deve ser o aspecto das coisas para aqueles insetos. Certamente algo verdadeiramente fantástico e absurdamente diferente daquela imagem que se forma no cérebro humano quando vê o mesmo objeto. Evidentemente se num determinado momento o ser humano ficasse dotado daquele tipo de olhos, por certo ele não reconheceria nada daquilo que antes lhe era habitual, tudo tomaria outras formas, características especiais e bem diversas daquelas que os olhos humanos fornecem ao cérebro.

Existem insetos que dispõem de órgãos olfativos tão precisos que sentem odores de coisas que estão muitos quilômetros distantes.

Podemos dizer que no universo as formas de percepções são infinitamente numerosas.

As pessoas têm uma tendência a transportar para outros seres, para outros reinos, os valores da percepção humana. O que ainda é pior, eles pensam que os seres de outras formas de existência têm as mesmas formas de perceber as coisas. Um espírito percebe tudo de forma absolutamente diferente, pois ele não tem órgãos sensoriais, portanto tem outras formas de perceber as coisas. Reconhece as coisas porque, sendo dotado de razão, pode estabelecer parâmetros e formular conceitos que permitem o estabelecimento de conclusões. Acontece como no exemplo dos diferentes sistemas astronômicos que fazem análises das observações e chegam a um consenso comum quanto ao aspecto do firmamento que cada um “vê” de uma forma especial. Um espírito que viveu na terra forma uma imagem mental que equivale a uma percepção, mas o que eles “veem” realmente é algo inconcebível para nós. Por experiência mística podemos dizer que há uma sensação de visão e de audição, mas são sensações já devidamente elaboradas pela mente espiritual. Também numa experiência mística há percepções de natureza totalmente diferente daquelas que se fazem presentes através dos órgãos físicos.

Só o que acabamos de dizer basta para termos que reformular tudo o que se tem escrito e dito a respeito do mundo espiritual. Muitas das imagens mentais são como que “montagens” cerebrais, estruturações segundo conceitos que se tem das coisas.

Após estas considerações, nos detenhamos um pouco e pensemos como um mesmo ambiente se modifica de uma forma quase que absoluta pela modificação dos órgãos detectores. Qual é realmente o aspecto das coisas? – Por certo não é qualquer um daqueles visualizados pelos diferentes seres. Aquilo que parece a realidade para um deles em verdade não o é para outro.

Um outro ponto que não deve ser deixado à margem nesta palestra diz respeito ao pensamento atual da Física Quântica. Quando se estuda o sentido de REALIDADE precisa-se considerar o PRINCÍPIO DA INDETERMINAÇÃO DE HEISENBERG (1901-1976). Segundo esse princípio há um limite teórico para a precisão, uma vez que não se pode medir simultaneamente e com absoluta precisão a posição e a quantidade de movimento de qualquer objeto no universo. Segundo o Princípio da Incerteza de Heisenberg, observar é perturbar. Evidentemente que muitos pensam que o Universo existe independentemente do observador, mas isto não é verdade, porque o simples fato de se observar é o bastante para se modificar aquilo que é observado.

Só é possível se fotografar a trajetória de uma partícula subatômica porque a iluminação necessária para o registro fotográfico do evento, um fóton, foi de encontro à partícula, mas aquele “encontro” inevitavelmente acarreta alteração da verdadeira posição da partícula, consequentemente aquilo que ficou registrado não corresponde mais à posição da partícula e sim à posição que ela tomou depois de ser atingida pelo fóton.

Outro ponto que merece apreciação diz respeito ao fato da matéria, por mais densa que seja, só representa uma aparência, porque na intimidade de suas moléculas as partículas estão “girando” num vórtice incrível. Como consequência nenhuma imagem de qualquer objeto é a mesma quando ele é visto duas vezes seguidas; por menor que seja o intervalo de tempo considerado, o arranjo interno daquilo que é observado já se modificou de forma imensa. Macroscopicamente parece que a coisa é a mesma, mas, submicroscopicamente, tudo já se modificou. Numa fração ínfima de tempo, por exemplo, um milionésimo de segundo, ou bem menos, já é o suficiente para que o objeto em evidência haja se transformado subatomicamente. A disposição íntima de suas partículas que turbilhonam incessantemente já é outra. A cada fração ínfima de tempo as partículas já não ocupam a posição exata de antes. Isto a nível grosseiro das percepções sensoriais não tem significação alguma, mas em nível de cálculos de física nuclear deve merecer atenção pela grande importância que têm.

Quando se fala de objeto pensa-se logo em estabilidade, numa estrutura estável, mas no mais sólido dos sólidos tudo está se alterando com uma velocidade incrível, mas, como isto ocorre num ritmo fantástico, os sentidos físicos imperfeitos não registram as mudanças. Graças a isso é que naquele objeto parece não estar havendo alterações, quando na verdade no objeto estão ocorrendo alterações em dois níveis, um de grande velocidade e outro extremamente lento. (Nas palestras seguintes nos aprofundaremos nisto.)

De todos estes comentários acreditamos que, tanto quanto estamos convictos, nada daquilo que percebemos de alguma coisa é realmente aquilo que julgamos ser. Temos consciência de que aquilo que percebemos das coisas é apenas a soma de algumas frequências vibratórias e não de todas elas que só assim revelariam o que a coisa é na realidade. Desta feita, nunca estamos detectando absolutamente o tudo de alguma coisa.

Construímos a realidade de algo por aquilo que examinamos segundo o que detectamos parcialmente pelos órgãos que dispomos, e por dispositivos especiais que criamos, para efetivar uma conversão de frequência em outras que possam originar percepções cerebrais.

Para limitar ainda mais a realidade das coisas há outro fator tremendamente significativo, que diz respeito a fatos ligados às reações psicológicas de quem faz uma observação.

Sabemos que várias pessoas que observam algo simultaneamente nunca são unânimes nas conclusões. É muito comum duas pessoas observarem uma mesma coisa e, como consequência de estados psicológicos diversos, terem consciência de coisas diferentes. São inúmeros os exemplos citados nos tratados de psicologia. 

Pessoas com alterações fisiológicas e bioquímicas podem apresentar condições que resultam em diferentes graus de conscientização diferentes de um mesmo fenômeno, como é o caso do daltonismo, em que o órgão visual é incapaz de perceber a cor verde, percebendo apenas certa tonalidade de vermelho. Assim sendo o mundo para ele é diferente do mundo para as pessoas não acometidas daquela alteração visual.

Se, por exemplo, dispuséssemos daquele órgão das serpentes que lhes faculta perceber os raios infravermelhos, um objeto qualquer, quando fosse visto à noite e quando fosse visto durante o dia, seria completamente diferente nas duas observações. Diferente porque o calor diurno faria com que ele emitisse maior quantidade de infravermelho, em conseqüência o aspecto daquilo que é observado tomaria um aspecto diferente. Na verdade haveria grande diferença entre uma observação feita à noite e outra feita durante o dia.

Quem nos acompanhou nesta palestra compreende agora algumas das razões que levaram os pensadores a duvidarem de tudo, de só terem certeza da incerteza. No tempo de Descartes não havia ainda sido feito um estudo profundo das vibrações. Desconhecia-se quase tudo a respeito do Universo e especialmente de que tudo aquilo que o constitui é tão somente manifestações vibratórias.

Para terminar, assinalemos que apenas um conceito se enquadra na definição de REALIDADE. Tudo no mundo creado é o resultado de algum nível de vibração de uma “essência” primeva, consequentemente as únicas realidades existentes no Universo são: UM MEIO ESSENCIAL EM VIBRAÇÃO, de natureza passiva e que pode ser representada graficamente como uma das pontas de um triângulo, e outra condição que sabemos ser capaz de fazer vibrar aquele primeiro elemento, e que pode ser representado pela segunda ponta do triângulo. Finalmente da interação entre aquelas duas polaridades resulta a terceira ponta do triângulo, que é a manifestação de tudo aquilo que existe, porém de uma forma dinâmica que jamais poderá ser concretizada como “a coisa em si”. As três realidades únicas do Cosmos que citamos são elemento constitutivo da natureza do Poder Superior, por isto pode-se dizer:

A ÚNICA REALIDADE ABSOLUTA EXISTENTE
É O PODER SUPERIOR, TUDO MAIS É RELATIVO E IRREAL.

Mecanismos defensivos do ego

JOSÉ LAÉRCIO DO EGITO  F.R.C.

"Mais vale uma hora de sábio do que uma vida de tolo."
Adágio popular.

Tema 1285
2000 - 3353

O ser em nível psico-emocional está constantemente sendo alvejado por inúmeros fatores externos no sentido dualístico e estabelecendo defesas-ego". 

Existem muitos fatores que ameaçam o ser em seu nível psíquico e que não o lesionam fisicamente, mas que violam a integridade do "eu" defendido pela muralha do "ego". O "ego" funciona como um escudo que procura reter as injúrias psíquicas que possam ameaçar o "eu". Este pode perceber que está sendo alvejado, mas muitas vezes isto se passa de forma que a pessoa não percebe, mas mesmo assim ocorrem conseqüências sobre a sua integridade. Visando proteger o "eu" a mente constrói um sistema de mecanismos defensivos, desde simples modos de agir até outros altamente destrutivos, como estudaremos oportunamente.

O ser humano vive numa perene luta contra códigos, contra paradigmas, estabelecidos pelas religiões, pelo estado, pela família, e por ele próprio. Trata-se de um sistema de conceitos de errado e de certo; de pecado e de virtude, de mal e de bem. Tudo isto são apenas conceitos desde que na unicidade não há lugar tais coisas. Embora sejam convenções ainda assim, estas são a causa básica de todo o sentimento de culpa existente nos seres. 

O que as religiões fazem no campo espiritual é idêntico ao que a Psicologia faz em nível de "ego". As religiões estabelecem códigos morais que visam convencer as pessoas a aceitá-los como "princípios divinos", como "desígnios", "desejos" ou "determinações de Deus", depois as induzem a se sentirem culpadas se não os obedecem, se cumprem ou não as determinações. Se a pessoa cumpre, ela não se sente em conflito, não haverá culpas e assim se sente espiritualmente em paz, portanto em um estado de "céu". Do contrário ela se sente em pecado, portanto num estado de "inferno". Assim vivem as pessoas, imersas em conceitos que geram culpa e culpa gera sofrimentos. A inobservância das normas morais gera o remorso, gera uma angústia por desobedecer àquilo que ela incorporou como certo. Mas, isto gera um tipo de angústia que pode ser chamada de "angústia secundária", diferente da "angústia existencial" que pode ser chamada de "angústia primária". Esta representa um estado muito mais profundo que não se baseia na desobediência a paradigmas constituídos, mas sim à ameaça induzida pela competição com os pretensos múltiplos "eus". Superar a angústia secundária é bem mais simples que superar a primária, pois para tanto basta obedecer aos códigos que a culpa cessa e com ela todas as conseqüências, mas o mesmo não acontece em se tratando da angústia existencial. A angústia secundária é estabelecida pelo sentimento de violação dos códigos vivenciais, portanto basta cumpri-los para que ela cesse assim também todas as suas conseqüências. Mas o mesmo não se pode dizer da angústia existencial, pois esta não se baseia em códigos violados, mas sim no arraigado conceito da dualidade. Assim sendo, somente com a libertação do conceito de dualismo existencial é que ela poderá ser aniquilada. Nisto consiste a libertação do ser, mas não basta aceitar teoricamente que a dualidade é uma ilusão, mas sim se sentir uno e isto corresponde aquele estado que as doutrinas orientais chamam de Nirvana. 

A principal característica da ilusão da dualidade é o surgimento do "ego". Este, em grande parte, é construído basicamente por códigos aceitos, e isso é o que faz uma pessoa se sentir diferente das demais. O Eu é eterno, é único, está isento de sofrimentos, enquanto que o "ego" é efêmero, algo criado pela própria pessoa desde a sua primeira manifestação no mundo imanente. Grande parte da vida neste mundo imanente consiste numa perene luta de criar condições egoicas, de criar regras de conduta pessoais - códigos - e também de aceitar muitos que lhes são sugeridos ou impostos, ou de afastá-las e modificá-las. Isto constitui um processo muito difícil de se sair dele, o qual é chamado de "Roda da Vida" ou "Sansâra". Podemos dizer que o "ego" é parte essencial do Sansâra. Sem o "ego" não haveria individualidade alguma. 

A psicologia clássica age da mesma forma que as religiões, ela faz a pessoa reconhecer os paradigmas ensinando-lhe métodos de convivência sem conflitos com eles. Conduz a pessoa a viver sem conflitos, reforçando a auto-imagem, mas sem visar o semelhante. Ensina o viver bem consigo mesmo estabelecendo métodos para a pessoa só ver a si mesmo, e não ter conflitos por tudo aquilo que possa infringir aos demais. Reforça o "ego" transformando-o em um rochedo; centraliza tudo na própria pessoa, o que representa um tremendo reforço da individualidade. Gera um "ego" tão sólido que a pessoa convive com o mundo sem conflitos, mas não diminui de forma alguma angústia existencial. 

Com uma sólida estrutura egóica a pessoa deixa de sofrer porque cristaliza o problema em nível de "ego", assim os conflitos deixam de ser problemas, e como conseqüência a pessoa pode viver em paz, viver bem, mas não plenamente curado porque persiste em toda sua intensidade a angústia existencial, a Psora Latente. Tanto as religiões comuns quanto a psicologia, não levam a um estado de libertação daquilo que a Homeopatia chama dePsora Latente, pois na verdade elas acorrentam o ser uma condição irreal que é o "ego". Se alguém sofre por uma culpa a psicologia reforça o "ego" no sentido dela passar a aceitar aquilo como algo não conflitivo fazendo-a não se sentir culpada, portanto conseguindo viver relativamente bem, mas mesmo assim muito distante da libertação do estado de "angústia existencial". 

As religiões, ao menos, induzem a pessoa viver sem conflitos e sem causar culpa nos demais, enquanto a psicologia isto não é levado em conta. Isto acontece porque a psicologia vê o mundo pessoal como "eu" e os "outros". Tenta eliminar o sofrimento do "eu" em detrimento dos "outros". Este é um lema da psicologia, mesmo que os psicólogos neguem-no: Viva bem consigo mesmo procurando resolver o seu próprio problema, não interessando os demais. Cada um é cada um. Viva bem consigo mesmo, e esqueça os outros, isto é o que a psicologia tradicional incentiva. Para ela cada um é cada um, o que vale é viver sem culpa, mas para isto faz uso do reforço do "ego", sem saber que isto é apenas uma ilusão. Isto acontece porque os próprios psicólogos, em sua grande maioria, vivem na ilusão da realidade do "ego, não percebendo que a pessoa é um fragmento de uma Consciência Maior. Sem esse conhecimento faz a pessoa continuar perdida no mundo fragmentário, estreito e limitado da Imanência, em vez de auxiliá-la a compreender que o "ego" individual não vai além de uma auto-imagem artificial. 

Não toda a Psicologia, mas algumas linhas acreditam que o viver sem conflito é um estado de liberdade, não se dando conta porém de que este mundo dialético funciona num nível restrito, que a liberdade na imanência é semelhante a um prisioneiro que de adaptou à própria cela, onde por um determinado tempo não percebe que está vivendo num nível restrito, sendo por isto incapaz de assimilar a riqueza total de outras experiências existenciais "interiores" e "exteriores". São incontáveis os mecanismos sociais, morais, familiares, econômicos, institucionais, etc, que têm como objetivo fazer a pessoa viver bem através de uma cristalização do "ego". 

O "ego" é algo que a pessoa acredita ser a sua própria natureza pessoal, esquecendo que se trata de um amontoado de conceitos individualizantes. A individualidade é o que há de mais marcante nas pessoas a nível se mundo imanente. É o "ego" que separa, que diferencia, que fragmenta, portanto que afasta o individuo da sua natureza essencial "una" que na verdade está representada pela expressão: "Os altos fins da existência". O mais elevado fim da existência é aniquilação da dualidade, o pleno retorno à origem, o que indica o "passar da posição de egoísta para o de altruísta" conforme se expressava o Mestre Thomas Pablo Paschero, eminente homeopata argentino. Vemos que é exatamente o "ego" quem mantém "samsara" citado pelas religiões védicas. 

Para conseguir se sentir mais seguro como individualidade distinta a pessoa lança mão de uma série de mecanismos egóicos, de fórmulas através dos quais ela amplia a autoconfiança, mas cuja conseqüência direta é a ampliação da descontinuidade, o aumento da separação, e tudo isto é relegar a verdadeira natureza do ser "uno" a um plano de inexistência, não se importando com a problemática dos demais. Ao "eu" divisionário o que importa é ele se sentir bem a despeito das demais, a "parte" - pessoa - continuar acreditando ser uma entidade separada da Natureza Única. 

Na verdade as religiões tendem configurar um estado altamente egóico, pois que agem protegendo a integridade do "eu" através do "ego" de uma forma bem peculiar. Mas, de um modo diferente daquele instituído pela psicologia. A esta só interessa o "eu" a despeito do "outro" enquanto que as religiões embora também considere o "eu" e o "outro" acrescentam um componente que chamam de altruísmo. Como disse Jesus "Amai ao teu próximo" essa expressão tem uma conotação plenamente dualista, diferindo da segunda parte quando complementa: "como a ti mesmo" cuja conotação é unista. Mesmo considerando o altruísmo, as religiões pregam o dualismo, pregam a separação afastando a pessoa da Realidade Única, tirando-a do caminho da libertação e orientando-a para o alvo da acomodação dualística. 

É o estabelecimento da Descontinuidade a origem do sofrimento oriundo da insegurança existencial como dualidade. Nesta condição o ser se sente desprotegido, vulnerável por todos dos lados levando-o a tentar inúmeras formas de preservação, modos para proteger a pseudo-ideia do "eu" individual, fortificando cada vez mais as qualidades que caracterizam o "ego" ao preço da ampliação da angústia primaria - angústia existencial - e da angústia secundária oriunda dos apegos.