PEREGRINI SANTIAGO
Tema 182
2014 - 3367
"A existência é elaboração da mente."
— P.
O Universo é irreal também em decorrência das impressões imagéticas subjetivas, internas à pessoa: as percepções subjetivas. Sabemos que a mente se apresenta no ser humano sob dois aspectos básicos: objetivo e subjetivo. As percepções subjetivas não são tão conhecidas quanto as impressões objetivas (as que representam os contatos empíricos do ser com a realidade "externa", mediante os chamados "cincos sentidos", no plano físico), pois, na verdade, as pessoas pouco sabem a respeito dos canais mediante os quais as percepções subjetivas são utilizadas.Porém, afirmamos que os canais em questão ultrapassam muito os cinco canais objetivos [tato, paladar, audição, gustação e visão].
A maior quantidade dos canais subjetivos decorre da existência de uma ampla gama psíquico-interna geratriz de inúmeras elaborações mentais advinda, num primeiro momento, do contato dinâmico com os objetos externos. Nesse sentido, a percepção subjetiva implica, em tese, maiores possibilidades de ilusões, pois estes equívocos interpretativos decorrem de associações inter-imagéticas que não coincidem com o referencial conceitual e físico do objeto percebido. Assim, a percepção subjetiva, por assim dizer, reduplica, reforça a imagem flutuante dos objetos. Falamos, então, de umareduplicação ilusória.[1] A primeira dimensão perceptiva, baseada na percepção objetiva, recebe as impressões vibratórias dos objetos do mundo, analisando-os e interpretando-os, segundo várias variáveis, como, por exemplo, a formação cultural do observador, o seu sabe-ver, poder-ver e querer-ver. Na segunda dimensão observacional, a percepção subjetiva, está implicada a elaboração interna/subjetiva dos objetos, via associação e motivações estritamente ligadas às impressões imagéticas retidas na mente. Então, existe, de algum modo, uma inter-relação necessária entre a percepção objetiva e a subjetiva; enquanto a primeira parte da observação de referenciais externos ao indivíduo, por impressão vibratória, a segunda elabora, por associação psíquica e imagética entre os objetos, diversas construções flutuantes de imagens e conceitos. Visto que a percepção subjetiva é uma construção mental-pessoal e intransferível da imagem do objeto, existe margem a uma gama mais complexa e vasta de associações, ou seja, engendra maior número de apreciações ilusórias.
No mundo objetivo, o número reduzido de canais diminui o número de realidades. Por isto, é mais fácil duas pessoas concordarem com uma realidade estabelecida a partir de uma observação oriunda dos cinco sentidos físicos do que a partir de uma vivência extrassensorial. Logo, não apenas o mundo “objetivo” é relativo em “realidade”; o subjetivo também o é, e, provavelmente, em grau bem mais elevado. Uma das capacidades da mente é a projeção transdimensional. Com efeito, a mente é capaz de projetar-se para planos existenciais diferentes. Entre os mundos relativos para onde é capaz de ser deslocada, citamos o plano astral. Sabemos que o plano astral, para um ser que esteja em sintonia psíquica com esta dimensão, é tão real quanto o plano material o é para um ser encarnado, quando está em estado de vigília ao nível lúcido-material. Entre as condições inerentes ao plano astral, existe uma que se reveste de tremenda importância para aqueles que sejam capazes de efetivar uma projeção psíquica até o referido plano. A matéria da qual é composta o plano astral, em seu nível vibratório correspondente, é altamente ideoplástica, isso é, moldada pelo desejo mental. A rigor, a ideoplastia afeta todos os níveis dimensionais do Universo, pois o Universo é Mental. Contudo, existe uma relação direta entre a densidade do plano e a ação ideoplástica. Por exemplo, o plano material também é ideoplástico, mas, como a sua densidade vibratória é muito superior à do plano astral, os efeitos da concretização imagético-material do desejo são muito mais lentos, quase sempre não-instantâneos. O plano astral, por outro lado, é muito mais ideoplástico, devido à sua composição vibratória ser mais sutil. Neste plano, a mente, motiva pelo desejo de ver ou ter, pode facilmente moldar o que imagina. Assim, basta que o desejo mental seja efetivo para que a matéria astral forme instantaneamente o que é desejado, cujo resultado imediato é determinada forma sutil formando certa imagem, assumindo justamente a forma pensada. Essa capacidade ideoplástica do plano astral é passível de elaborar diversas vivências imediatas.
No plano material, a “realidade” que cada um tem das coisas decorre, sobretudo, das limitações sensoriais. Praticamente, inexiste a interferência instantânea da mente sobre a matéria comum. No plano astral, porém, existem, além das limitações impostas pela percepção subjetiva, também as elaborações mentais imediatas, as quais podem, como já vimos, facilmente ocorrer. No plano subjetivo, as realidades são intrínsecas a cada percepção pessoal, não somente nos níveis de percepções objetivas, mas também no nível de ação que a mente pode determinar e elaborar como imagem em relação àquilo que é desejado e observado. Embora haja, no plano material, diferenças importantes em relação à imagem que os seres elaboram acerca do Universo, no campo psíquico [sobretudo ao nível astral], estas diferenças são muito mais acentuadas, a ponto das duas imagens de um mesmo “objeto” não guardarem nenhuma semelhança, especialmente em decorrência da maleabilidade da matéria da qual é constituída o plano astral. Esta alta maleabilidade engendra imediatas, constantes e dinâmicas elaborações ideoplásticas.
As percepções mentais que uma pessoa tem dos outros planos também fazem parte do modelo pessoal de Universo. A(s) imagem(ns) elaboradas do mundo não envolvem, como temos visto neste artigo, apenas as características materiais. Já ressaltamos que o mundo astral possibilita que a mente elabore instantaneamente o que deseja, podendo estruturar tudo de maneira bem mais acentuada do que no plano material. Esta possibilidade de estruturar psiquicamente com alto índice de realização imediata gera um grau de irrealidade bem mais pronunciado do que aquele ligado à matéria comum. Por conseguinte, a reduplicação ilusória no plano astral é muito mais intensa do que no plano físico. Na dimensão material, as ilusões também existem, mas são, por um lado, mais ou menos rapidamente elaboradas, a partir da percepção de objetos externos ao indivíduo; por outro lado, mais rapidamente elaboradas, mas ao nível intra-subjetivo, cujas imagens formadas, quase sempre, são apenas visualizadas na tela mental, sem que sejam concreta e instantaneamente realizadas. Na dimensão astral, contudo, o alto índice ideoplástico da matéria faculta elaborações mentais instantâneas, mas com reduplicação ilusória, na medida em que aquilo que é formado astralmente, mediante o desejo, não faz parte da realidade externa deste plano. Ou seja, é a interferência direta e imediata do desejo psíquico que gera uma imagem astral meramente projetada da mente do espírito para a realidade astral exterior.
A condição altamente ideoplástica do plano astral, em grau muito mais elevado do que ao nível da matéria densa, não implica que tudo o que é percebido naquela dimensão seja “alucinação” ou apenas “idealização”. Com efeito, quanto maior é o desejo de que algo seja realizado no astral, maior é o índice de reduplicação ilusória. Contudo, como ressalta, por exemplo, a Ordem Rosacruz, AMORC, no momento em que o espírito silencia, no plano astral, o seu diálogo interno, suspendendo temporariamente o desejo de vê ou ter, pode apresentar a percepção autêntica dos objetos astrais externos à sua percepção pessoal. Neste caso, aqueles objetos são, de certa forma, independentes da projeção volitiva do espírito. Então, a “realidade” efetiva do plano astral, embora exista, é de muito mais difícil constatação. Para um espírito encarnado, é praticamente impossível que tenha uma clara ideia de como é o mundo astral. Por isto, recomendamos que o místico evite prender-se à análise racional daquele plano. Deve extrair os conhecimentos de lá, se preciso for, deve aprender como agir lá, mas não querer elaborar uma imagem de como é o plano, pois tudo aquilo que imaginar será uma imagem incompleta e deformada.
Como vimos, as percepções objetivas não permitem que tenhamos uma compreensão exata quanto à natureza real de alguma coisa, assim como as percepções subjetivas não o permitem, especialmente quando ancoradas no plano astral. Isso deve ser considerado com muita atenção, assim como por pessoas que estiverem sob a ação de determinadas substâncias psicoativas. Num estado alterado de percepção determinado por drogas, torna-se possível a exploração outros planos dimensionais. Neste caso, o usuário está sujeito a penetrar nos “labirintos” de sua mente e atingir níveis astrais de percepção em alguns planos, onde as situações se mostram de uma forma tal que não tenha o suficiente conhecimento da natureza daquilo que está sendo percebido. Por isto, é possível que a pessoa desenvolva conflitos psicológicos imprevisíveis e desagradáveis. Em decorrência da extraordinária alteração das percepções ao nível astral, a “realidade” de cada pessoa que empreende uma exploração de outros planos pode diferir tremendamente de outra pessoa, de modo que pode apresentar opiniões completamente diferentes sobre um mesmo evento.
No mundo da matéria densa, duas pessoas podem divergir em alguns pontos sobre aquilo que é observado, mas, tratando-se de outros planos, a divergência pode ser extrema. Assim, as “realidades” relacionadas com as projeções psíquicas de duas pessoas podem ser dramaticamente díspares e até mesmo conflitantes. Por exemplo, uma das pessoas que tenha efetuado uma projeção lúcida para o plano astral pode relatar que viu uma “bela paisagem luminosa”. Outra pessoa, que igualmente se projetou, pode afirmar, em relação ao “mesmo evento”, que não viu “nenhuma paisagem luminosa”. Contudo, a não-concordância não quer dizer que o mundo astral não exista como fenômeno percebido. Ou seja, não quer dizer que aquelas pessoas estejam mentindo ou sendo vítimas de uma “alucinação”. Na realidade, elas apenas estão sendo, por assim dizer, “vítimas” de percepções diferentes, em decorrência de o astral ser, como já ressaltamos, um mundo altamente ideoplástico. Um mundo onde a mente molda tudo com uma facilidade incrível. Um plano onde podem ocorrer imensas e aparentes incongruências perceptivas quanto àquilo que for definido por pessoas diferentes. Assim, o mundo astral deve ser considerado “segredo pessoal e intransferível”.
Conforme ressalta a AMORC, em concordância com a VOH, o mundo astral não deve ser penetrado com a “mente ativa”, com qualquer pensamento pré-concebido ou sem um devido silêncio do “diálogo mental interno”. Numa situação de “tagarelar metal”, o efeito da ideoplastia pode prejudicar a percepção efetiva daquele plano. Uma pessoa que não tenha certa prática neste campo pode se vir diante de problemas que invalidem a própria experiência que tiver, devido à interferência direta do desejo pessoal de ver, ocasionando vivências irreais e duplamente ilusórias. Haverá tendência de a pessoa considerar reais e efetivas vivências que foram elaboradas unicamente por sua percepção pessoal. Falamos, então, de uma percepção alterada da “realidade astral”, levada a cabo por uma elaboração ideoplástica. Analisar eventos do mundo astral com a mente ativa promove elaborações pessoais na matéria sutil. Nesse sentido, aquilo que for elaborado tenderá a ser percebido e aceito como uma “realidade”, como algo com “existência efetiva”. É por esta razão que determinadas Ordens Místicas advertem seus adeptos a claramente distinguirem elaborações ideoplásticas unicamente pessoais dos objetos astrais independentes daquelas formações psíquicas. Aquelas Ordens agem, portanto, com cautela e seriedade, ensinando que a percepção do mundo da matéria astral não tem o devido valor, quando efetivada por pessoa sem o devido preparo.
Anteriormente, vimos que, por exemplo, a AMORC adverte que a pessoa, a fim de vivenciar e até mesmo analisar o plano astral, não deve procurar ver coisa alguma, não escutar coisa alguma e não ver coisa alguma. Isto equivale, em outras palavras, a fazer cessar o diálogo interior, para a mente tornar-se passiva e o indivíduo receptivo. Somente desta forma uma experiência mística no plano astral, mais até do que no plano material, pode ser válida. Do contrário, não o será, porque a pessoa verá ou sentirá aquilo que a própria mente tenha elaborado e não algo que tenha existência “independente” à sua percepção. Ocorre que, com frequência, a não-observância deste procedimento psíquico ocasiona problemas variados para o imprudente. Aliás, isso até mesmo acontece em determinadas doutrinas religiosas, as quais, geralmente devido ao não-conhecimento de certos fenômenos astrais, não preparam eficientemente os seus adeptos. Estes, quando conseguem manter alguma forma de contato com o plano astral, chegam a conclusões geralmente equivocadas, resultando em fantasias as mais diversas. Sabemos que o Princípio da Incerteza de Heisenberg[2] não tem muito significação no nível das grandes dimensões do plano material, nas vivências do indivíduo com o meio, porque a interferência imposta pelo observador sobre o comportamento da matéria se processa em um nível muito abaixo do dinamismo das impressões quânticas. Segundo aquele princípio, a interferência perceptiva do indivíduo sobre a realidade quântica, embora ocorra, não é constatada ao nível material-objetivo, quase não alterando, por conseguinte, a percepção objetiva do indivíduo. Entretanto, no plano astral, tudo muda, pois a matéria sutil se altera claramente de forma perceptível. Além disso, a mente ativa, baseada no efetivo desejo de elaborar formas psíquico-imagéticas, somente pode ser útil no plano astral quando se pretende um fim definido, como, por exemplo, pretende-se elaborar determinada situação, como a “cura”. Porém, quando se pretende apenas a obtenção de informações, a mente deve estar passiva, receptiva, mantendo suspenso o diálogo interno.
Quando os resultados de certas experiências místicas são transportados para a mente objetiva [no estado de vigília], as opiniões são tão diferentes entre si que se tornam inacreditáveis para quem possui um mínimo de senso crítico. É isto que facilmente gera um completo descrédito quanto à autenticidade das vivências místicas. Praticamente, inexistem concordâncias nas informações de diferentes “médiuns” sobre determinado evento, mas isto não indica que sejam “mistificadores” ou “impostores”. O que ocorre é que, em geral, as pessoas que medeiam os contatos interdimensionais não possuem o necessário conhecimento, por exemplo, dos fenômenos do plano astral. Necessitam ter ciência das possíveis ilusões que a mente objetiva é capaz de produzir, quando opera naquele nível. A ignorância destes fenômenos pode gerar armadilhas perigosas, onde caem frequentemente os incautos, e, assim, enganam e também são enganados. Por estas razões, até que uma pessoa tenha experiência e conhecimentos suficientes do plano astral, é preferível que não se envolva com certas experiências extrafísicas. O mundo astral existe, porém, é mister conhecer as suas leis, para que não se venha a ser totalmente ludibriado.
Em decorrência do elevado índice ideoplástico do plano astral e das características das percepções psíquicas, cada pessoa possui vivências segundo suas crenças, suas capacidades intelectuais, seus anseios e desejos, entre outros fatores. Para mais claramente exemplificarmos isso, sabemos que muitos indivíduos que tenham passado ou passem por experiências supra-físicas ao nível astral percebem muito mais o que gostariam de ver do que efetivamente viam. Por exemplo, um nativo tenderá a perceber “formas de índios”; um tibetano perceberá “mosteiros e monges”; um católico, “páramos celestiais” ou “purgatórios e infernos”; um bruxo, “um mundo de entidades demoníacas”, assim por diante. A explicação para isto é exatamente esta: essas pessoas entram em tais experiências perceptíveis com a mente ativa, a qual “molda”, na matéria sutil do astral, precisamente aquilo que supõem ser o “mundo do além”. A percepção de outros planos dimensionais é autêntica, mesmo que haja eventuais equívocos observacionais em relação ao mundo exterior e efetivo do astral. Existe uma sintonização, ou mesmo uma projeção da mente para o mundo astral. Contudo, aquilo que se vê ali objetivamente pode ser, relembremos, apenas uma creação mental. A pessoa pode ver, participar de um ambiente moldado por sua própria mente. Aquilo que é moldado pela mente passa a existir por maior ou menor tempo, conforme a duração da intensidade do desejo manifesto. Algo estruturado pela mente ativa no plano astral é uma realidade tanto para quem elabora a imagem quanto para outra pessoa que mantenha sintonização adequada e isto é uma experiência interessante, porque muitas coisas podem existir construídas desta forma.
Para concluir este artigo, ressaltamos que os planos supramateriais, em função das suas próprias características vibratórias, são bem mais mutáveis do que o plano da matéria densa, razão pela qual não devemos considerá-los como “realidades absolutas”. Cada plano representa, então, universos relativos e pessoais. São mundo relativos, porém, não são mundo inexistentes.
-------
[1] Este artigo é baseado no tema 0.058 ["A irrealidade subjetiva"], redigido pelo Respeitável José Laércio do Egito.
[2] Princípio da Mecânica Quântica segundo o qual não se pode precisar com exatidão a posição e o momentum de uma partícula.