Mundo Imanente e Mundo Transcendente

                                                                             JOSÉ LAÉRCIO DO EGITO — F.R.C.

Tema 995
1999 - 3352

“Não há solidão real. Todos estamos impregnados do viver com os outros."
— Valter da Rosa Borges. 

A maioria das pessoas jamais indaga sobre a existência de outros mundos além deste onde estamos, contudo também há uma fração que fala de outros mundos, mas no sentido de lugares chamados inferno e céu, porém sem que haja qualquer preocupação em situar tais lugares. Também existem aqueles que estendem um pouco mais o limite de indagação, e chegam ao nível da existência de diversos planos, entre eles o mundo denominado de astral, mas sempre dentro da conceituação de que todos eles são apenas níveis de um mesmo universo.

Na verdade existe grande confusão em torno daquilo que se conceitua chamar mundo, por isso vamos tentar esclarecer e situar as coisas de forma clara.

Para muitas pessoas ligadas a algumas religiões, prevalece a ideia de que o céu significa simplesmente um estado de espírito, uma condição mental, mas possivelmente a maior parte delas chega mesmo a acreditar que inferno e céu são lugares físicos, concretos, objetivos. Por certo tais pessoas nunca indagaram a respeito da localização desses lugares. Pelo que ensina o ortodoxismo católico, por exemplo, tratam-se de lugares físicos, fora deste mundo objetivo que vivenciamos.

Com os avanços da ciência, começaram as inquirições a respeitos de planos em dimensões paralelas, chegando a própria física a admitir a possibilidade da existência não só de dimensões além daquelas que conhecemos e vivenciamos, mas também de outras, e mesmo de universos paralelos. Mas tais universos paralelos sugeridos pela física corresponderiam àquilo que as religiões descrevem como inferno e céu? Também fica no ar a indagação sobre o surgimento de tais planos. Seriam eles inerentes à creação deste universo, ou algo independente dele? – Se realmente existirem as dimensões paralelas, a hipótese mais provável é de que elas hajam aparecido concomitantemente com aquelas básicas que conhecemos, ou seja, elas seriam partes integrantes deste universo.

Agora são de certa importância duas indagações a respeito deste universo, que, por muitos, é chamado de “universo dialético”. Pessoalmente preferimos usar como denominação a expressão “mundo imanente”. Seria ele eterno ou temporário? Pelo que falam as religiões, e a própria astrofísica, ele teve um início, houve um momento considerado o início da creação, momento esse que as religiões denominam de “Fiat Lux”, e a astrofísica fala do Big Bang.

Desde o período védico, na Índia, diz-se que, antes que este universo existisse, já existiaBrahman, sendo Este um “Princípio Incriado” (eterno).

De uma forma ou de outra, o conceito que dualisticamente prevalece é o de que houve uma creação, e isto nos força fazer a seguinte indagação: A partir de Quem, ou do que, se originou a creação? De um “nada” absoluto? – É muito difícil se poder entender que, de uma inexistência absoluta, origine-se algo. A Teoria Quântica diz que, antes de tudo, deve ao menos haver existido “informação”. Em outras palavras: onde nada existe há informação.

Quer consideremos um Creador, ou um algo que possa ser conceituado como informação, a partir do que procedeu a creação, vale a indagação: Qual a localização do elemento creador antes do surgimento deste mundo? Evidentemente, como não existia o universo que conhecemos e que chamamos de “mundo imanente”, é claro que este não existiu num plano paralelo inerente ao próprio universo, ou seja, num daqueles planos mencionados como integrante do nosso mundo.

Na verdade, as religiões védicas em geral, assim como a própria ciência, dizem que tudo surgiu de um ponto adimensional, portanto sem espaço algum. Mas é óbvio que ele existia em lugar algum, pois, não havendo universo, não havia lugar. Mas, ao mesmo tempo, ele existia, pois deu origem ao universo. Poder-se-ia dizer que o agente creador existia numa dimensão paralela, mas queremos afirmar que tal não seria possível, a não ser que se entenda como dimensão paralela algo que não pertence diretamente ao Cosmos. Se pertencer ao universo é óbvio que não pode se tratar de um plano de creação transcendente, por ser apenas parte do universo, evidentemente algo surgido depois da creação.

O raciocínio que temos desenvolvido nesta palestra nos conduz à admissão da existência teórica de dois mundos, sendo um deles imanente, ou seja, resultante da creação, e o outro transcendente, aquele a partir do qual procedeu a creação.

O Hermetismo estuda certos princípios básicos, sem os quais não poderia existir aquilo que se chama universo físico, ou seja, princípios físicos, que caracterizam o mundo imanente. Agora vamos conjeturar sobre o limite entre esses dois mundos, ou seja, onde termina um e começa o outro. Conforme se sabe, um deles, o imanente, se caracteriza pela manifestação dos Princípios Herméticos, enquanto o outro não, pois que neste tais princípios apenas podem existir como potenciais. Diante disso poderia se dizer que o limite do imanente pode ser assinalado pela presença dos princípios herméticos em ação. Mas a inquirição persiste: quando ou onde os princípios têm início?

O nosso objetivo, nesta palestra e na seguinte, é analisar a existência ou não de um limite separativo entre os dois mundos, o imanente e o transcendente.

Até mesmo para a astronomia existe um limite para o tamanho do universo, o que quer dizer que ele nem é eterno em tempo – pois teve começo – e nem infinito em espaço – ocupa uma área. Segundo as hipóteses astronômicas, o universo ocupa uma área correspondente a um diâmetro que a astronomia admite ser dentro de um limite entre 12 a 20 bilhões de anos luz. Em decorrência da relação espaço-tempo, este também seria o limite em tempo medido a partir do Big Bang (tempo zero e espaço zero).

O que existiria então além desse limite de tempo e de espaço? – Uma incógnita, pois o espaço só existe no mundo imanente, a própria doutrina einsteniana nos fala do espaço-tempo. Além daquela fronteira não poderia existir espaço vazio, e, mesmo que pudesse, continuaria válida a indagação de até onde vai aquele espaço vazio, qual o seu limite. Vemos que dizer que, além do universo delimitado segundo a ciência, existisse o espaço totalmente vazio; isto não nos auxilia como resposta, pois isso seria uma maneira de transferir a indagação do onde se situa o limite do universo físico para do onde o do espaço vazio. Uma das respostas seria o espaço vazio ilimitado. Mas sendo assim ele seria infinito, e neste caso, ele teria que ser aceito como sendo o próprio Deus, pois, como já dissemos muitas vezes, o infinito tem que ser o próprio Deus, caso contrário Este estaria contido no infinito e algo contido não pode ser absoluto. Assim, o Deus – contido – não seria o absoluto, pois além d’Ele haveria o Infinito – continente.

Terminaremos aqui esta palestra, pois o assunto é bastante delicado, pelo que requer grande atenção e acuidade mental, para ele poder ser devidamente acompanhado no que estamos querendo fazer, que seja sentido. Assim, damos um intervalo, a fim de que primeiro seja bem sentido o que acabamos de expressar.