O perceber a parte como o TODO

                                                                                JOSÉ LAÉRCIO DO EGITO -— F.R.C.

Tema 1411
2004 - 3359

"O tempo e a mente são inseparáveis."
— Eckhart Tolle.

Quando se diz é preciso o ser se libertar da Mente, na verdade o que se pretende dizer é que ele tem que se libertar das limitações que são a mente. A consciência contém o todo e a parte. Mesmo que se considerem as partes como sendo ilusões ainda assim elas, de certa, forma existem, mesmo como ilusões elas existem, e se existem devem constar no “É”. Seja qual for a coisa, ou condição, real ou ilusória deve fazer parte do “É”, sendo assim mesmo as ilusões são partes integrantes da Consciência.

Na verdade não é mente quem contém as ilusões, mas sim estas que contêm a mente, ou melhor, constituem a mente. A Consciência deve de dar conta das manifestações da mente para que ela – o ser – não seja dominado. Por ser um tanto difícil a compreensão do que estamos dizendo por se tratar de algo muito abstrato, então vamos usar como analogia o conto: “O Elefante e o Marajá”. Ele já nos foi muito útil para o entendimento de diversos pontos abordados nesta série de palestras e certamente o será para mostrar a relação entre mente e consciência:

“Visando divertir um Marajá visitante, foi mandado apresentar um elefante a vários cegos, mas de forma que a cada um fosse mostrado apenas uma parte distinta e não o animal como um todo. Depôs, na presença do Marajá foi mandado que cada um dos cegos descrevesse o que era um elefante. A confusão foi tremenda e terminou em luta corporal quando cada um descreveu o animal. Aquele a quem haviam mostrado apenas a pata como sendo o elefante o descreveu de uma forma; ao que haviam mostrado a tromba, de outra; ao que havia haviam mostrado apenas a orelha, de outra”.

A luta aconteceu porque não pôde haver concordância entre os cegos a respeito do que era um elefante, a respeito do qual cada um tinha uma idéia diferente conforme o que havia percebido e consequentemente entendido. Neste conto vale a indagação: qual a realidade e qual a ilusão? - É fácil notar que a realidade era o elefante como um todo, enquanto que cada parte era uma ilusão de ser o elefante. Mesmo assim vale salientar que as partes mesmo sendo ilusões, mesmo sendo ilusões concernentes à totalidade, ainda assim não deixavam de serem partes do elefante.

Nesse exemplo o elefante pode ser comparado com a consciência e as partes como as ilusões pertencentes a um contexto que chamamos de mente. Para eliminar a luta dos cegos não seria preciso destruir as partes, mas apenas fazer cada um entender que estava sob a ação da ilusão da existência da parte como sendo todo. Evidentemente não seria fácil um cego perceber o todo, mas naturalmente bastaria que lhes fossem apresentadas as demais patês. Para libertá-los da ilusão seria preciso admitir que idéia que tinha do elefante não passava de uma ilusão de totalidade,[1] que percebera apenas partes e conseqüentemente aquilo que perceberam era Maya. Esse conto pode ser a aplicado aos seres humanos; as pessoas correspondem aos cegos que, mesmo não percebendo o TODO da Consciência ainda assim acreditavam serem as frações percebidas a realidade. Dizer que a tromba seja a realidade de um elefante é mera ilusão, assim também dizer que as percepções que se tem são verdadeiras no tocante à realidade plena.

Os seres não percebem o TODO – Consciência – mas somente as partes – mente. Para chegar a perceber a realidade – o TODO– é preciso entender que aquilo que é percebido, tanto objetiva quanto subjetivamente, é apenas parte da consciência filtrada pela mente. Aqueles cegos estavam presos à ilusão da parte ser o todo e realmente para eles não era fácil admitir que o outro tivesse razão. A razão dele não comporta a do outro e muito menos a de todos eles compondo a realidade plena. Somente cientificando-se da verdade, o que implicaria no sentir que sua concepção era apenas uma parte de algo distinto, seria a forma de se libertar de ter a certeza de viver na ilusão e de ser ela a verdade. Baseado nisto, podemos dizer que o ser a fim de se libertar necessita recordar sua real natureza, ou seja, se tornar um recordado e então perceber como consciência e não como mente.

As ilusões que integram a mente são partes da consciência, assim podemos dizer que a mente só se manifesta dinamicamente, quando em atividade. As partes do elefante só se manifestaram ativamente como algo independente quando ativadas pelos cegos. Fora disto ela apenas existe no elefante[2]. Há correspondência entre isto e a mente. Para existir como algo independente da Consciência ela procura sempre negá-la para substituí-la. Por esta razão é que há tanto empenho para manter a ilusão como verdade, para conservar a qualquer custo as ilusões que lhes dão sustentação. Acontece como se as partes do elefante para continuarem a ocupar o lugar dele como um todo procurasse de todas as formas preservarem tudo aquilo que lhe servisse de sustentação, até mesmo os próprios cegos. Fizesse tudo para que estes não passassem a enxergar. Pois a partir do momentos que eles viessem a enxergar a partes desmoronaria como todo, cada uma continuaria existindo no elefante, mas não mais tidas como sendo este em sua plenitude.

Assim, para um dos cegos sentir que a parte não era o todo do elefante não seria preciso destruir a parte e sim, de alguma forma, cientificá-lo disto, de forma a não deixar dúvidas. Veja-se que destruir as partes acabaria por destruir o próprio elefante. Uma parte apenas que fosse destruída já não se poderia que o restante era o elefante completo. O mesmo se pode dizer quanto à mente. Não é destruindo a mente que se liberta o ser, mas fazendo-o entender a verdade que as ilusões são ilusões e não a totalidade. Destruir as ilusões, destruir a mente é o mesmo que destruir a própria Consciência. Consciência é infinito e a infinito nada pode ser adicionado e nem tirado.

O objetivo mais elevado da Senda Mística e o propósito essencial da VOH[3], é ensinar meios da pessoa se libertar da mente, não tentando destruí-la, por ser isto impossível, mas compreendendo os modos como ela se impõe e não deixando que este o aprisionem. Não vale tentar destruir o dominador, mas sim os elos que mantém o ser prisioneiro. Em outras palavras, conviver com a mente sem se identificar com ela, pois a destruição seria o mesmo que a eliminação da Consciência. Logicamente uma  condição impossível para qualquer ser. Se viesse acontecer ocorreria a volta à Inefabilidade. Não dizemos que mente e consciência sejam polaridades, mas para o nosso entendimento pode ser assim aceito. Não é possível se destruir um pólo sem que se destrua o outro, desde que ambos são aspectos de uma mesma coisa. Já vimos em temas sobre polaridade que ao se unirem as polaridades chega-se ao Infinito, e então aquilo que antes existia como imanência passa a existir apenas como transcendência.

Baseado no que dissemos sobre a impossibilidade da mente ser destruída, vamos transmitir ensinamentos que visam a entender os laços que mantém o ser distanciados da Consciência Clara, e assim poder fazer com que o domínio sobre os distintos laços sejam sucessivamente desfeitos até quando estes já não sirvam de corrente aprisionante. Desfeito todas os elos o ser estará livre sendo então apenas Consciência.*

(*) Observação: este artigo ainda não foi submetido à revisão ortográfica e gramatical. 

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[1] Não estamos afirmando se tratar de uma alucinação – percepção sem objeto – mas sim de uma ilusão – percepção com objeto. As partes do elefante existem, contudo elas não o ele.

[2] Quando dizemos ativamente nos referimos ao processo de identificação e não a atividade que cada parte exerce no animal.

[3] Iniciais de uma autêntica fonte de estudos herméticos.